Eis-me aqui



[foto daqui]

«Chamar 'tu' a Deus, com variantes que vão da imprecação à súplica, é o arbítrio maravilhoso da criatura que remonta à sua origem e a interroga, por ela chama e a sacode na distância. Quem pela primeira vez exclamou a primeira oração não a pode ter inventado. Só pode ter reagido a um chamamento com uma resposta, como Abraão com o seu "hinnèni", eis-me aqui. Eis-me aqui é a primeira palavra, a premissa de toda a oração. A criatura separa-se do resto da espécie e da criação, exclui-se para estabelecer a relação. A oração acontece sempre numa extremidade do campo. Lê-se no salmo 78: "E conduziu-os à sua morada santa" (Sl 78,54). Deus leva os hebreus para o deserto, porque aquele é o lugar do encontro. Não os chama num centro, numa praça, mas no isolamento inóspito do vento e do pó.
No deserto: é este o lugar físico da oração. O crente cria o vazio à sua volta e desta forma faz acontecer o encontro


[Erri De Luca, «Caroço de Azeitona», Assírio & Alvim, p.7]

3 comentários:

  1. esse "Caroço de Azeitona" promete e palpita-me que vem a caminho do meu domicilio :)))). Esse e mais uns da Assírio que está fulgurante nesta entrada de ano editorial, de tal forma que me detenho no mistério: somos uns estranhos felizardos: tão portentosos títulos para tão pouca gente que lê....

    Abraço
    TSC

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  2. Pois, este «agarrou-me» logo :-) Infelizmente, «a sério» só li mesmo o prefácio, apesar de ser um livro pequeno. É do tais que só consigo ler em passo de caranguejo (uma frase para a frente e logo a seguir duas para trás e assim sucessivamente).

    [ Só aqui entre nós, que ninguém mais lê, confesso que ainda estou para perceber como é que há quem perca tempo a ler e discutir os «Caim» desta vida tendo à sua disposição livros como este... Mistério!... :-) ]

    Abraço

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