Amor

Amor, amor, amor, como não amam
os que de amor o amor de amar não sabem,
como não amam se de amor não pensam
os que de amar o amor de amar não gozam.
Amor, amor, nenhum amor, nenhum
em vez do sempre amar que o gesto prende
o olhar ao corpo que perpassa amante
e não será de amor se outro não for
que novamente passe como amor que é novo.
Não se ama o que se tem nem se deseja
o que não temos nesse amor que amamos,
mas só amamos quando amamos o acto
em que de amor o amor de amar se cumpre.
Amor, amor, nem antes, nem depois,
amor que não possui, amor que não se dá,
amor que dura apenas sem palavras tudo
o que no sexo é o sexo só por si amado.
Amor de amor de amar de amor tranquilamente
o oleoso repetir das carnes que se roçam
até ao instante em que paradas tremem
de ansioso terminar o amor que recomeça.
Amor, amor, amor, como não amam
os que de amar o amor de amar o amor não amam.

Jorge de Sena, Antologia Poética, Guimarães, p.191



6 comentários:

  1. Haja embora uma incoincidência rítmica (no meu entender subjectivo), que não de motivo, é sempre bom sabê-la de volta, c. a..
    Um bom domingo!

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  2. Julgo que entendo o que quer dizer. Refere-se à música de Mozart: o poema é "excessivo", a música "contida". O que me levou a associá-las não foi, de facto, o ritmo, mas a circunstância de cada uma das peças (poema e bailado) ter sido construída sob "fundações" clássicas, aqui transformadas e levadas ao limite. Obrigada APS. Um bom domingo!

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  3. A circunstância de "Gémeos", que tão bem conheço..:-))
    Declaro-me vencido pela sua sólida argumentação!...
    E, já agora, cordialmente, que a próxima semana, c. a., seja muito boa!

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  4. Nem mais! :-))
    Obrigada, APS, ainda que com uma semana de atraso... :-)

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  5. Por acaso, gostei desta junção, à partida «improvável». :)

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