03/04/11

Os anjos

Os anjos não modificam
sua voz ou estarmos
dentro de nós para sempre

Alberto Soares, Equilíbrio, Caminho da Poesia, p.9


27/03/11

Geometrias




A arte exprime, por meio dos traçados geométricos a que recorre, uma gama de relações entre os seres ideais que concebe; essas relações não são puramente descritivas nem unicamente racionais. Talvez seja mais legítimo falar de uma geometria "emblemática", onde se conjugam duas ordens de "figuras", uma delas constituída pelo código de sinais convencionados da comunicação utilitária e social, a outra pelo léxico dos símbolos, encarados aqui como sinais do que é linguisticamente incomunicável, como homologias necessariamente precárias daquilo que se atinge, não por comunicado, mas por comunhão.

Lima de Freitas, Almada e o número, Editora Soctip, p. 103

21/03/11

A place to be

If you can do something about a situation, there’s no reason to be upset. 
If there’s nothing you can do about the situation, there’s no reason to be upset.




18/03/11

Segredos de alma

A gente nipónica é inteligente, alegre, volúvel, dissipadora; profundamente sensível às belezas naturais; pouco inventiva, mas dotada de admiráveis aptidões para adoptar os progressos estranhos, de indústria, de arte, de ciência, elevando-os a um alto grau de originalidade, à força de transformá-los. E pouco mais se respiga do enigma moral deste povo, em que é justo supor-se, pelo absoluto recolhimento em que se formou e em que viveu, segredos de alma insondáveis.

Wenceslau de Moraes, Traços do Extremo Oriente, Círculo de Leitores, p. 135


13/03/11

Ich habe genug


Ich habe genug,
Ich habe den Heiland, das Hoffen der Frommen,
Auf meine begierigen Arme genommen;
Ich habe genug!
Ich hab ihn erblickt,
Mein Glaube hat Jesum ans Herze gedrückt;
Nun wünsch ich, noch heute mit Freuden
Von hinnen zu scheiden.


12/03/11

Estes dias

Compõe a lógica interior dos factos:
vais entrar na paz da simetria
no lugar
onde o azul se faz
e a noite vai nascendo devagar.

Alberto Soares, Equilíbrio, Caminho da Poesia, p.41


Viajar



Viajar é desaparecer, uma incursão solitária por uma estreita linha geográfica até ao esquecimento.
Paul Theroux, O Velho Expresso da Patagónia, Quetzal, p.23

Grata ao Arpose, onde «descobri» o pintor

08/03/11

Fio

Não começou ainda mas fustiga
já as veias a negra primavera:

o ar do meio de março outra vez liga
o coração à pele como na espera

do que já não virá, mesmo que diga
o contrário o vão eco de outra era

Pele, espelho do sol, dele te abriga
de noite a luz do céu que recupera

o brilho dos altos tectos diluídos
na infância e nos sonhos, os sentidos
tornando mais selvagens: o espesso

calor do ar de março engrossa o rio
interior do sangue, oculto fio
do passado com que o futuro meço

Gastão Cruz, Escarpas, Assírio & Alvim, p.38




Para MR, com amizade.

04/03/11

Automatismo

Não há automatismo puro, em arte. Os conflitos e as cintilações do inconsciente produzem uma objectividade que parece desdenhar de toda a objectividade mental. Mas a consciência é a região nobre do automatismo, visto que o inconsciente não tem escrita nem linguagem, excepto a histeria e o seu processo.

Agustina Bessa Luís, Dicionário Imperfeito, Guimarães Editores, p.22 

27/02/11

Os pássaros

Ouve que estranhos pássaros de noite
Tenho defronte da janela:
Pássaros de gritos sobreagudos e selvagens
O peito cor de aurora, o bico roxo,
Falam-se de noite, trazem
Dos abismos da noite lenta e quieta
Palavras estridentes e cruéis.
Cravam no luar as suas garras
E a respiração do terror desce
Das suas asas pesadas.

Sophia de Mello Breyner Andresen, Antologia,
Moraes Editores - Círculo de Poesia, p.100

26/02/11

Canção

Este ritmo pousado não tolera mais
a sombra que inicias cidades escondem-se
assustadas do que pensas das minhas
insónias as palavras recuperam a força
e munem-se de garras ou soletram
de excessiva ternura o teu nome em segredo:
reunem as vogais mais doces para múltiplos
desastres
amadurecem tensas como as uvas.

São o feitio de uma escova no cabelo cercam-
-te de luz e trazem-te magnética e descalça
à minha rua por túneis de violência em direcção
ao dia.
De tudo aquilo que proibem amo-te

com o rigor incompassado de uma cheia
uma alteração sinistra de todos os sentidos
buscando a levíssima queda última
de pássaros que se guiam como cegos
de pedra em pedra aguda que não sabem
morrer em vôo como no teu sangue
límpido amanhecer de súbito e de noite.

Alberto Soares, Escrito para a noite, INCM, p.15


20/02/11

Palavras do Guru

O fogo telúrico - o karma - é destruidor ou construtivo.
O fogo celeste - o dharma - inspira.
Tudo o resto são palavras mágicas
que te podem levar ao céu ou ao inferno, ao inverno ou à primavera...
e o segredo está em olhar com soberana indiferença o bem e o mal que há em todos os fenómenos e coisas... e nos mistérios
e assim... princípio e fundamento ... ver com amor e vento a brisa
... o cair das folhas,
o intervalo... o nascer dos rebentos, a eclosão das flores...
chegado o tempo para lhes comer os frutos, ó árvore sagrada do jardim do Paraíso...

19/7/76

Ruy Cinatti, Folha volante [in Vyassa, Poema do Senhor Bhagavad-Guitá]
Assírio e Alvim, p.333

Lembro-me de ti...

  Lembro-me de ti... Na escuridão profunda da memória, o teu olhar ilumina a estrada percorrida na história da minha vida. E sinto, em mim, ...