07/09/25

Echad Mi Yodea



Ohad Naharin (coreografia),  Batsheva - the Young Ensemble 

Ciclos

 



As casas ardem como ardem
as florestas. Por cima delas, outras casas
crescem como nascem outras
florestas. O que se renova pode ser visto como
se nada existisse antes dele: as janelas
que vemos, fechadas ou abertas, dão para
vidas, fechadas ou abertas, que são como
todas as vidas que se passaram por trás
de outras janelas, fechadas ou abertas. E
as árvores que nasceram onde outras
árvores arderam deitam as mesmas folhas
e brilham com as mesmas flores, enquanto
outros incêndios não destroem outras
casas e outras florestas. De que
nos queixamos, então? Dessa fotografia
em que o fogo apagou o único rosto
de que nos queríamos lembrar? Desse tronco
que abrigou o corpo em busca de uma sombra,
depois do amor? E quando olho estas
casas que se erguem à minha frente,
ou quando passo numa floresta repleta
de sombras e de perfumes, pergunto o que
sucedeu a esses breves instantes que
o tempo apagou, no seu curso, e se desfazem
em nada quando os procuramos, no gesto
inútil de reencontrar esse rosto de que não ficou
nem a memória, ou na tentação de procurar
a árvore que acolheu um amor que acreditou
ser eterno como as flores dessa primavera.

Nuno Júdice, "O Coro da Desordem", Publicações D. Quixote, 2019, p.24-25       

 







Echad Mi Yodea

Ohad Naharin (coreografia),  Batsheva - the Young Ensemble