A moralidade. Seria simplório pensar que o problema moral em relação aos outros consiste em agir como se deveria agir, e o problema moral consigo mesmo é conseguir sentir o que se deveria sentir? Sou moral à medida que faço o que devo, e sinto como devo sentir? De repente a questão moral me parecia não apenas esmagadora, como extremamente mesquinha. O problema moral, para que nos ajustássemos a ele, deveria ser simultaneamente menos exigente e maior. Pois como ideal é ao mesmo tempo pequeno e inatingível. Pequeno se se atinge: inatingível, porque nem ao menos se atinge. «O escândalo ainda é necessário, mas ai daquele por quem vem o escândalo» - era no Novo Testamento que estava dito? A solução tinha de ser secreta. A ética da moral é mantê-la em segredo. A liberdade é um segredo.
Embora eu saiba que, mesmo em segredo, a liberdade não resolve a culpa. Mas é preciso ser maior que a culpa. A minha ínfima parte divina é maior que a minha culpa humana. O Deus é maior que minha culpa essencial. Então prefiro o Deus, à minha culpa. Não para me desculpar e para fugir mas porque a culpa me amesquinha.
Embora eu saiba que, mesmo em segredo, a liberdade não resolve a culpa. Mas é preciso ser maior que a culpa. A minha ínfima parte divina é maior que a minha culpa humana. O Deus é maior que minha culpa essencial. Então prefiro o Deus, à minha culpa. Não para me desculpar e para fugir mas porque a culpa me amesquinha.
Clarice Lispector, A Paixão Segundo G.H., Relógio D'Água Editores - Ficções, p.69