(...) E porem me parece este nome de ssuydade tam proprio, que o latym nem outro linguagem que eu saibha nom he pera tal sentido semelhante. De sse aver alguas vezes com prazer, e outras com nojo ou tristeza, esto se faz, segundo me parece, por quanto suydade propriamente he sentydo que o coraçom filha por se achar partydo da presença dalgua pessoa, ou pessoas que muyto per afeiçom ama, ou o espera cedo de sseer. E esso medês dos tempos e lugares em que per deleitaçom muyto folgou. Dygo afeiçom e deleitaçom, por que som sentymentos que ao coraçom perteencem, donde verdadeiramente nace a ssuydade mais que da rrazom nem do siso. E quando nos vem algua nembrança dalguu tempo em que muyto folgamos, nom geeral, mas que traga ryjo sentydo, e por conhecermos o estado em que somos seer tanto melhor, nom desejamos tornar a el por leixar o que possuymos, tal lembramento nos faz prazer. E a mingua do desejo per juyzo determynado da rrazom nos tira tanto aquel sentydo , que faz a ssuydade, que mais sentymos a folgança por nos nembrar o que passamos, que a pena da myngua do tempo ou pessoa. E aquesta suydade he sentyda com prazer mais que com nojo nem trizteza.
D. Duarte, Leal Conselheiro,
in História e Antologia da Literatura Portuguesa, séculos XIII-XV, vol.I, FCG - Serviço de Ed. e Bolsas,p.487